domingo, 28 de novembro de 2010

MEMÓRIAS SUJAS (parte final)



Memórias Sujas

  ( . . . )



            Era noite da sexta-feira. Gustavo estava deitado na cama, esperando Débora, que havia ido banhar-se. Ele era puro êxtase, vivendo um momento singular em sua vida. Apareceu sua musa, nua, na porta do quarto. Ele a chamou com os olhos e foi prontamente atendido. Ela deitou-se ao seu lado, fitando-o por alguns segundos. Depois, ele deitou a cabeça em seu colo e sentiu a pele ainda fria.
            — Meu querido — falou ela, com a voz ao mesmo tempo doce e libidinosa — você ainda não me disse onde trabalhava.
            — Não disse? — perguntou ele, questionando a afirmação dela.
            — Na verdade, você ainda não me falou nada de sua vida, apenas o seu nome… Guilherme.
            — É que falo pouco sobre mim…
            — Você é o meu Salvador, gostaria de saber mais ao seu respeito. O que faz?
            — Sou engenheiro, desempregado no momento.
            — Em quê?
            — Ah… mecânico, sou engenheiro mecânico. Mas já tenho um trabalho em vista.
            Ela sorriu.
            — Às vezes parece que estou sonhando. Nunca pensei que trairia o meu marido… É engraçado como as coisas acontecem de repente…
            Gustavo não olhava para ela, tinha os olhos fixos no vazio. Ela continuou falando como se ele prestasse atenção a tudo; mas não, dele ela ouvia apenas monossílabos. De repente, ela disse algo que o trouxe de volta à realidade, como se tivesse entendido tudo que ela falara até então.
            — Devem estar preocupados comigo, amanhã ligarei para minha mãe. Confio nela.
            Gustavo a olhou e sorriu. No tempo que estiveram juntos, não haviam conversado mais que duas frases.
            — Vou até a cozinha, meu amor, quer algo?
            Débora sorriu.
            — Não… ah, traz um pouco d’água.
            Foi a vez de ele sorrir. Antes de desaparecer, ela o chamou:
            — Guilherme — ele se virou, ela continuou: — Eu te amo!
            Gustavo saiu do quarto em direção à cozinha. Abriu a geladeira e tirou a garrafa com água. Pegou uma bandeja de metal e sobre ela colocou um copo e a garrafa. Antes de sair, voltou e, na gaveta, pegou uma faca, que também foi acomodada na bandeja. Seguiu para o quarto. Débora estava deitada, nua, de costas para ele. Admirou mais um pouco sua beleza chispante, envolvente. Ela o percebeu e virou-se para ele. Recebeu o copo e a garrafa e retribuiu com o seu sorriso mais alegre e agradecido. Passou por ela, e enquanto pousava, por trás dela, a bandeja sobre a cama, pegou a faca sem que ela percebesse e a enterrou em suas costas. Ela caiu, largando copo e garrafa, num urro surdo de dor, depois um grito aterrador ecoou. Débora arrastou-se no chão por alguns metros, quase sem força e com metade do corpo paralisado. Virou-se para o agressor, suas poucas lágrimas perguntavam por que. Elas não obtiveram resposta. Gustavo estava parado, taciturno, como se nada demais tivesse feito. Seu semblante era assustadoramente tranquilo. Ela tentou gritar, mas nem um sussurro conseguia mais soltar, seu pulmão havia sido perfurado e enchia-se de sangue, que se precipitava já pela boca. Ele caminhou na direção dela, abaixou-se e, sem piscar uma única vez, esfaqueou-a até que estive morta, o que não demorou muito. Sentou-se ao lado do corpo, o qual esfriava lentamente, e assim ficou até a manha do dia seguinte.
            O dia amanhecera nublado, sombrio, mas não choveu. Gustavo trabalhou o dia inteiro. Primeiro carregou o corpo até a cozinha, arranjou panelas grandes e o picou todo, acomodando as carnes e vísceras, sem os ossos nas panelas. Os ossos, ele os serrou todos, guardando em sacos de lixo; o mesmo fora feito com a pele e a cabeça; tudo bem embalado, para que ninguém pudesse identificar. Essa tarefa tomou-lhe a manhã inteira; à tarde limpou o sangue que se espalhava pelos cômodos, cozinha, corredor e quarto. À noite preparou uma refeição leve, depois, recolheu-se ao quarto limpo e dormiu.

            Compro o jornal. Preciso procurar emprego, amanhã já é outubro. Como o tempo passa rápido. Devo ter problemas de memória, talvez algum tipo de amnésia, é de suma importância consultar um médico, um especialista. Como posso esquecer o que fiz durante mais de uma semana? Preciso realmente ir ao médico, senão nunca conseguirei manter-me num emprego. Ah! aqui tem um: “precisa-se de técnico em informática”. Pronto, amanhã mesmo vou à luta. Se conseguir o trabalho, será o quinto apenas nesse ano. Não posso me descuidar, não dessa vez.


FIM

6 comentários:

Danila disse...

Meu Deus!!!!!!!
Mais um fim trágico!!!!
Credo RicaRRRRdo... Posta ao menos um com o final feliz!!!
Estou começando a ficar com medo!!!!
Abraço!

Ricardo Lima Guimarães disse...

Se preocupa não, que o próximo será romântico!!! (rs)

Danila disse...

Assim espero!!!!!!
Rsrsrsrsrs
Abraço!
E até o próximo conto!!!

MÁRLON SOARES disse...

Ricaaarrrdooo!

Você é um sociopata controlado!

Eu gostei. Cruel, como alguns aspectos da vida.

Next!!!!

Laís Leite disse...

Profs, tô chocada! :O
rs
Mas o conto é ótimo.
Bjs

Unknown disse...

Que memória mais suja! (rs)
O conto é extremamente envolvente... muito bom!